domingo, abril 09, 2006
Adaptação mais do que livre da Sagrada Escritura
1 Naquele tempo, o sol já ia alto e Jesus, absorvido em Seus pensamentos, encarando a confusão em que havia se metido - o quão difícil seria redimir aquela gente, a Humanidade – vira-se repentinamente para Pedro e os demais e diz: “Meus irmãos, vamos beber”.
Embora uma leve dor de cabeça estivesse lhe incomodando, Pedro prontamente responde:
- É claro Mestre. Afinal já é quase meio-dia e esse sol lá fora está de matar. Lázaro, não estou me sentindo muito bem hoje e, já que você andou descansando por uns dias lá no sepulcro, vá buscar umas jarras de água para todos nós.
“Água???” bradou o Mestre, com Sua, geralmente, suave voz. “Pois estais louco? Vamos nos servir de umas medidas de vinho, preciso relaxar e, ademais, procuro clarear a mente.”
“Mas, Mestre... bebemos vinho ontem até tarde, após o sermão dominical”, retrucou Pedro, dando-se conta, só então, da razão de sua ressaca.
“Pedro! já vais começar a me negar? essa não!”
“Olha Mestre, com todo o respeito, mas nossa provisão de vinho acabou. Só se o Senhor...”.
“Ah, não, não... vocês estão se tornando muito indolentes, esperando que eu faça milagres a rodo. Está bem: se não tem vinho, vamos de cervejinha.”
Todos se entreolharam, em silêncio...
“Meu caro Judas, vê aí pelas redondezas uma meia-dúzia. Ah, ou melhor... esse pessoal sempre diz que não quer mas, quando chega a cerveja, acabam pedindo um copinho. Traz logo umas três dúzias. Ide, e vê se não demora, hein!”
Judas, curvando-se em reverência ao Mestre, logo retira-se do templo, a procura da bebida solicitada pelo Rei dos Reis.
2 Lá dentro, Jesus continua: “ô Pedro, já que vamos tomar uns goles, arruma pra nós aí umas sardinhas fritas pra acompanhar”.
“Mas, mas... mas Mestre !!! essa espécie de peixe não tem por aqui !! não dá pra ser algum mais comum não? Aliás, sobrou um tantinho de peixe de ontem...”
“Agora essa... Pedro! só hoje já estais me negando pela segunda vez. Onde é que isso vai parar? tá me reconhecendo não ?!? vê a sardinha aí. Deixe que, no final das contas, se o caldo engrossar, dou um jeito”.
E assim, foram-se Mateus, Lucas e Marcos à pesca.
3 Enquanto isso, ainda perto dali, Judas, com a grana que Pedro lhe passara pra comprar a cerveja, divagava: “bom, que eu saiba, cerveja boa tem lá na Baviera, mas é longe pra chuchu e a cerveja de lá é mais amarga, não é a preferida do Mestre... ah, mas vou pagar pra ver. Quero que, finalmente, ele mostre seus poderes para todo mundo, e transforme a cerveja numa mais gostosa - e mais geladinha - além do que, a de lá está mais barata, e assim embolso 30 moedas”.
Aqui vale uma explicação. Além dessa questão de ordem pessoal, havia outra, mais... prática.
Naqueles dias toda aquela região era dominada por um tal César. Não era inca, muito menos maia mas, na verdade, romano. César, inovador, queria padronizar o visual de seu império, daí que toda a cidade havia se transformado num grande canteiro de obras, chamado de “Jerusalém-Cidade”. Só que tanta obra e tantos tapumes prejudicaram o comércio local, diminuindo os postos de venda onde Judas poderia encontrar a cerveja que, pela escassez de oferta, andava caríssima e, pra piorar, era “batizada”.
4 E o tempo ia passando, e nada de ninguém voltar. Jesus, com a mufa quente por tanto serviço e a boca seca, para passar o tempo convoca uns discípulos que estavam por ali:
“Aproximem-se.”
“João, beije minha mão”. João, honrado, obedeceu.
“José, beije meu pé”. E José, todo satisfeito, cumpriu a ordem.
Jesus, avista um discípulo e o convoca:
“Ramalho...”
“Ramalho? Por que afasta-se ?!?!!?!?”
Por essa hora, Ramalho já se encontrava na rua, um tanto assustado, com o passo acelerado, por entre os gentios e soldados romanos.
5 Já com fastio por tanta demora, Jesus deu o braço a torcer, operou um milagre e, naquele momento, para surpresa dos pescadores, a rede de Mateus, Lucas e Marcos ficou abarrotada de sardinhas. Coisa de uns 100 kgs. E eles louvaram o Senhor (embora tenham achado um certo exagero; ficou pesado pra caramba levar tanto peixe até o Mestre – mas, fazer o quê...).
Pelo seu lado, quando nem na Grécia havia chegado ainda, repentinamente Judas se vê na germânia, frente a um mestre cervejeiro, que falava uma língua enrolada mas, embora não estivesse em Roma, quem tem boca vai à cerveja e assim, por meio de gestos, Judas comprou a tal da encomenda.
No entanto, Judas não podia esperar pelo que estava por vir.
Jesus, ciente da predileção de Madalena por champanhe e para que ela não o aporrinhasse enquanto tomava sua cervejinha com os amigos (sim, o champanhe ainda não havia sido criado, na verdade seria só dali a muitos séculos, dizem que por um seguidor Seu, um tal de Perignon, mas, já que estamos tratando de milagres...), teletransportou Judas para o norte da França onde ele, a contragosto, foi obrigado a gastar aquelas 30 moedas que havia economizado, comprando o champanhe (coisa cara, já então). E nesse momento, Judas não se deu por rogado: “ah, deixa Ele comigo. Noutra hora arrumo essas 30 moedas”.
6 Finalmente eis que todos chegam com as boas-novas, Judas com as bebidas e os outros três com o monte de peixes.
“Salomé, frita aí uns peixinhos pra gente”, ordena Jesus. “Judas, passa pra cá essa cerveja!”. Mas, eis que, já no primeiro gole, Jesus nota que aquela não era sua cerveja predileta. “Pô, Judas, que traição!! Você tá careca de saber que prefiro as belgas! Afasta de mim esse cálice!”.
Tomé arregala os olhos: “Fala sério Judas! Não acredito no que você fez!”.
“Não acredita?”, questiona veementemente Jesus. “Então, toma, bebe aí pra você ver”.
“Ah... eh... tá bom, Mestre, já estou vendo que não é das melhores. Não precisarei beber. Brigado...”.
7 E, em verdade vos digo que, naquele dias, até Pôncio Pilatos, político local, avisado da crescente influência de Jesus, também procurava aproximar-se Dele e, quem sabe, descolar até uma foto abraçados.
“Sabe como é, a campanha... a eleição taí...” assumiria, procurando disfarçar seus inconfessáveis interesses que navegavam de acordo com a maré.
Dito isso, eis que Pilatos, que havia acabado de surgir na área, dirigiu-se logo para a cozinha, de olho naquele suculento cardume de sardinhas, também recém-chegado. Salomé, procurando manter alguma mínima ordem, dispara:
“Seu Pilatos, lá fora tá a maior poeirada, ide pelo menos lavar vossas mãos”.
“Que lavar as mãos o que, mulher!”, retrucou o caudilho, arrematando: “Tô cheio de fome, sai da frente!”.
8 Enquanto isso, no salão principal, Jesus, pra lá de aborrecido, acreditando ser aquela cerveja a “batizada” da região, decide o que fazer com tudo aquilo:
“Que saco! querem saber? peguem essa porcaria de cerveja e devolvam a César o que é de César!”. Mas os discípulos, alarmados, quase em pânico – já que tinham sede e qualquer lembrança do mal-estar da noite anterior já tinha sido apagada de suas memórias - em uníssono suplicaram: “experimenta, experimenta!” e, com esse aparente mantra, conseguiram demovê-Lo de tal idéia.
9 E assim, se passou aquela segunda-feira; a cada nova garrafa aberta, como de costume, a cerveja tornava-se mais saborosa aos paladares dos convivas e todos deram graças ao Senhor por tal fartura de peixes e bebida. Apenas Madalena, no seu canto, estava um pouco arrependida, por não ter aproveitado para pedir a Judas pra dar uma passadinha em Paris e trazer uns cremes Lancôme.
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2 comentários:
Rapaz... e depois vc pede pra EU pegar leve... Ramalho...
Essa é antiga, mas, mesmo assim eu rolei de rir!
E bota livre adaptação nisso!!!
Caramba!
Ficou bom por demais da conta!
Sorte e saúde pra todos!
Uma espécie de samba-do-crioulo-doido igualmente muito engraçado. Mistura José com apóstolo e introduz (epa)um Ramalho sem precisar usar o Nicolau (da piada original). Mas é tudo muito criativo mesmo. Parabéns e obrigado pelos momentos de humor.
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