sábado, maio 06, 2006

"Ela é uma doce ilusão? o que é, o que é, meu irmão?"

"When you know that your time is close at hand, maybe then you’ll begin to understand, life down there is just a strange illusion" ("Hallowed be thy name" - Iron Maiden)
Nas últimas semanas tenho observado pessoas próximas que estão sofrendo por outras, queridas, que padecem. Sofremos com a dor do outro que amamos e nos apegamos à vida de uma forma absoluta, que não tem paralelo em nada.

Nos agarramos à nossa existência porque nada mais nos resta - nada com a envergadura da vida - "nada" ao menos de forma comprovada, de forma "científica". Se algo é provado cientificamente, ele “é”. Porém tudo não passa de ter eleito um determinado método como “o mais correto”. O método científico é um entre tantos. Ele nos é útil, funciona, pode ser repetido, comprovado. No entanto, entre o quase infinito rol de “provas” nenhuma coisa é mais valorizada que a vida, o que, se por um lado é uma questão mais que óbvia - visto nada ser mais "concreto" -, por outro lado me soa algo irracional, paradoxal. Por quê? Porque acreditamos em duas coisas opostas: aceitamos basicamente o que é comprovável cientificamente e ao mesmo tempo nos agarramos à vida - a "doce ilusão" do Gonzaguinha ou a "estranha ilusão", do Iron - e não suportamos seu o fim. Desejamos viver “até pelo menos oitenta anos, mas desde que com saúde”. Mas a vida, a “certeza” da vida (“certeza” que prezamos TANTO para os demais fatos) é calcada em quê ? no máximo, em pressupostos divinos, sobrenaturais. Não sabemos se vamos alcançar em paz o final do presente dia, por exemplo. Igualmente, não sabemos o que éramos antes de nascer. Ok, o amigo leitor e a formosa leitora, dirão: “é claro que éramos nada”. Pois bem, éramos o “nada”, seja lá o que o “nada” for...

Mas então surgimos. Nascemos. Nascemos, sim, mas não nos lembramos disso. Quando nos demos conta, estávamos por aqui, mantendo relações com outras pessoas como nós. Temos imagens que nos mostram como éramos ao nascer, bebês, etc. Mas quem éramos naquela época? (aí entraria outra questão: o que determinada alguém “ser”? a consciência? talvez).

E por fim, um dia, morreremos. Provavelmente uns e outros vão lamentar mas, depois de algum tempo, se não formos expoentes da espécie, tudo de nós sumirá. E, quando morrermos, como será? Claro, é uma pergunta meramente retórica. Um perguntar por perguntar.

Pois bem: nos agarramos a algo que não compreendemos e nem ao menos lembramos como começou (a não ser cientificamente!) e certamente não saberemos como terminará. Mas – essa fundamental antítese! – é tudo o que temos.

Milênios de cultura não nos fizeram aceitar essa condição. Por mais que saibamos que TUDO pode mudar no momento seguinte, procuramos criar um cenário sempre estável.

Quando alguém morre lamento por todos nós. Pelo que "se foi" e por nós, que ficamos.


Não pense que estou passando por um daqueles momentos de angustia perante as Grandes Perguntas. Sinceramente? não mesmo. Estou em um ponto (posso modificar, progredir, regredir, mas atualmente estou assim) em que tenho uma plácida consciência de que a vida é como uma seqüência de bolinhas de vidro no chão e a qualquer momento pode passar alguém ou algo e interrompê-la. A vida vale a pena justamente porque um dia vai terminar. Por sinal, há um novo livro de José Saramago, “As Intermitências da Morte”. É uma bem-humorada visão da necessidade e importância da morte.

No momento isso é tudo. Até breve. (Hummmm...)

4 comentários:

Denise S. disse...

Francamente, Frederico, não acho nada mal a idéia da morte. Temo, claro, não conheço - ou, se conheço, não me lembro, o que dá no mesmo - mas não é uma má idéia. Já pensou ficar aqui forever? O mundo mudando e a gente aqui? Não daria certo. E, curioso, a minha família, pelos dois lados, é de longevos. Hummmm...
p.s. belo texto. Como de costume.

Frederico disse...

Concordo com você, Denise. Já que há a vida, é fundamental o final desse ciclo - ou seja lá o nome que se quiser dar. O livro que citei, do José Saramago, mostra - com humor - o absurdo que seria nossa vida sem a morte. Seria impossível. Paradoxalmente, não estaríamos vivos, não haveria “isso que está aí”.

Anônimo disse...

Isso mesmo: não existe morte sem vida nem vida sem morte. E morrer não dói, já vi gente morrer, é quase um gozo. Viver é que dói, né? Às vezes.

Anônimo disse...

Frederico, finalmente consegui entrar no seu blog, bem sobre o que escreveu sobre vida e morte ,eu achei incrível...e o livro do Saramago eu estou acabando de ler, é uma maneira genial de tocar no assunto damorte e como precisamos dela e como seríamos deixados órfãos sem ela e como ela é elemento essencial da vida que é latência pura...o que incomoda não é bem a morte..o que mais incomoda é a incapacidade que o homem tem de explicá-la...quer dizer, irrita o homem moderno que isso a ciência não conseguiu ainda dominar...ao contrário...nunca sabemos , nem o dia, nem a hora...quer pior humilhação para oser humano que tudo controla e destrói do que isso? Seu blog é legal e você aquiparece ter uma sensibilidade especial...desculpe se o invadi. bjs Tê